domingo, 4 de outubro de 2015

GM Chevette, 1974, Amarelo Caju.


A foto acima é do início de 1978, quando eu ainda tinha pouco menos de 1 ano de idade. Estou com meu pai - na época, com 28 anos - no capô do Chevette, que havia sido comprado pelo meu tio, 2 anos antes.

No final da postagem anterior, contei que, em janeiro de 1976, meu tio, José de Ribamar, havia dado o Fusca 1300, 1967, Branco Pérola, mais uma quantia em dinheiro, como entrada em um Chevette, 1974, cor Caju, tendo o saldo restante financiado em 24 vezes. Trata-se do carro acima. O objetivo era  um automóvel mais novo, para, pela segunda vez, fazer a viagem de 3100 km entre São Paulo e Parnaíba, no Piauí. 


Na época da compra, o carro tinha menos de 2 anos de uso, estava todo original, motor 1400 e era um carro da moda, fazia um certo sucesso. Meu tio estava muito feliz com a compra, o que animou meu pai a tirar carteira de habilitação no mesmo mês da compra do Chevettinho - janeiro de 1976. As placas, amarelas, eram FO-1801. 

Desde o início de 1975, os dois irmãos estavam fazendo curso superior em Economia na FEFASP, mais conhecida na época como "Faculdade de Santana" - hoje, UniSant'Anna, meu pai já estava com minha mãe, que na época trabalhava como telefonista na, hoje, extinta TELESP. Meu pai conta que foram tempos muito felizes para os dois irmãos - apesar da morte do pai deles, por AVC, no Piauí, em agosto de 1974. 

Faculdade, carrinho novo, dinheiro sendo juntado para uma nova viagem de carro a Parnaíba. O primeiro automóvel que meu pai passeou com minha mãe, foi este; e o primeiro que ele dirigiu quando tirou, enfim, a carteira de habilitação. 

Em março de 76, meu tio foi passar o sábado com primos que moravam em Osasco. Meu pai não quis ir, pois preferiu passar o dia com minha mãe. Meu tio gostava muito de jogar dominó e passou o dia e a noite jogando e bebendo cerveja com os primos. No domingo de manhã, logo cedo, meu tio resolveu voltar para o apartamento, que ficava na rua Piratininga, na Mooca. Passando pela Avenida Francisco Matarazzo, não se sabe o certo o que aconteceu, perdeu o controle do Chevette, chocou-se contra um poste e, infelizmente, faleceu. 

Meu pai, que até então, estava tão feliz... Simplesmente perdeu o chão quando um policial chegou ao apartamento e deu a notícia, de uma só vez. Quis abandonar a faculdade, o emprego e voltar para o Piauí, afinal, havia vindo para São Paulo por causa do irmão - seu maior companheiro. E sem ele, por um momento, meu pai se sentiu sozinho em Sampa. Foi aí que a figura da minha mãe falou mais alto: apoiou meu pai em tudo, estando sempre ao seu lado. Os dois foram morar em uma casa na Avenida Conceição (antiga Estrada da Conceição), Vila Munhoz, Zona Norte de SP. 

Meu pai quis abandonar o Chevette, vendê-lo... não queria mais saber dele. Porém, o carro havia sido financiado, faltavam 22 parcelas para serem pagas e, como na época era difícil aprovar um financiamento de veículos, ainda mais para um carro relativamente novo como aquele, o primo do meu pai, que morava em Pirituba, havia sido fiador. E a pequena financeira exigiu a casa, recém construída pelo primo, como garantia. Hoje creio que não exista mais esse tipo de aval, mas na época ainda não havia Código de Defesa do Consumidor, essas coisas. E a "financeira" nada mais era do que uma "boca de lobo", pura agiotagem. O primo, que construíra a casa para casar, estava com a cerimônia marcada, cheio de prestações relativas à construção da casa, compra de móveis etc. para pagar e não podia assumir o financiamento do Chevette. Então, após as ameaças da financeira em tomar a casa do primo, meu pai recebeu o seguro obrigatório DPVAT, mandou consertar o carro e assumiu as 22 parcelas restantes. 

O Chevette ficou pronto 3 meses depois. Meu pai conta que a funilaria não foi muito bem feita. Originalmente, o carro tinha aquelas listrinhas pretas nas laterais. Mas o pintor não soube refazê-las e pintou o carro sem elas. A batida foi tão forte, que foi preciso trocar pára-lamas, capô, pára-brisa, uma porta e até o volante. Este, antes do acidente, era o original, de aro fino. Como quebrou na batida, meu pai trocou por um esportivo, modelo Grand Prix - GP (aquele com o desenho de um capacete no botão da buzina). Também mandou instalar um toca-fitas Roadstar. 

Meu pai relata que nunca mais o carro ficou bom: entrava água, era cheio de ruídos, fervia, dava diversas panes elétricas etc. Mas ainda era preciso terminar de pagá-lo. E em 7 de maio de 1977, eu nasci. Minha mãe trabalhando, meu pai também, mas havia filho pequeno, aluguel da casa, prestação do carro, mensalidade da faculdade de Economia... não foram tempos fáceis. Em 77, meu pai foi trabalhar na TUSA - Transformadores União, em Jundiaí. Continuou morando em Sampa e ia todo dia de carro para Jundiaí. Não sobrava muito dinheiro para manutenção e, além disso, o carro sofreu 3 pequenos acidentes em 2 anos. Nada grave, mas a lataria estava amassada por todos os lados e o carro estava feio. Em um deles, uma Variant I entrou com tudo na traseira do Chevette, enquanto meu pai estava parado em um sinal vermelho na Avenida Guilherme Cotching. O motorista da Variant esperou meu pai descer do carro e fugiu. 

Quando sobrava algum dinheiro para a gasolina, meu pai descia conosco para o Guarujá com o Chevettinho, pois uma tia da minha mãe morava lá e passávamos o final de semana na casa dela. 

Em 1978, quando o Santos F.C. foi campeão Paulista, meu pai e eu voltamos do estádio nele: eu no banco do motorista com o meu pai, apertando a buzina pelas ruas paulistanas, comemorando o título do nosso "Peixe"! 

Minha mãe conta que eu só dormia se meu pai desse uma volta de carro comigo. Ficava com a chave na mão chamando meu pai que, sem alternativas, atendia meu pedido. Eu sentava no banco de trás e, na primeira volta no quarteirão, adormecia.

Neste ano, minha mãe ficou grávida novamente. Em 14 de outubro, nasceu minha irmã Thaís e fomos buscar minha mãe e ela, na maternidade, com esse carro. 

No início de 1979, meu pai passou a ir trabalhar de ônibus, para economizar. O carro ficava estacionado em frente à casa em que meus pais moravam (pois a mesma não possuía garagem), na esquina da Avenida Conceição com a Rua Maraã. Essa rua, é uma descida bem íngreme e o carro passava a noite estacionado em cima da calçada. Pois bem, um dia, meu pai havia acabado de tomar o ônibus, logo cedo, para ir trabalhar. Minha mãe ficou na esquina, comigo nos braços, esperando meu pai passar, para acenar a ele. O ônibus do meu pai passou, minha mãe acenou e, logo em seguida, veio um outro ônibus pela Avenida Conceição, virou em direção a Rua Maraã, perdeu o controle, subiu em cima da calçada e bateu com força na traseira do Chevette. 

O ônibus perdeu os freios e, como a descida era muito íngreme, saiu arrastando o carro do meu pai por muitos metros. Ao arrastá-lo, o Chevette foi virando e, além da traseira, a batida afetou a lateral e a frente do carro. Era uma "empresa" de ônibus clandestina e se recusou a pagar o prejuízo (eram outros tempos, não havia Tribunal de Pequenas Causas etc.). O motorista morava em uma favela, próxima ao Parque Novo Mundo, tinha dois filhos deficientes e não podia pagar. 

No fim, meu pai ficou com o prejuízo. Ele havia terminado de pagar o Chevette, mas minha mãe tinha acabado de sair da TELESP, meu pai ainda estava no último ano de faculdade, filhos pequenos e não tinha como pagar o conserto. 

Um conhecido indicou um "funileiro" que trabalhava no Parque Edu Chaves, comprava carros batidos para consertar e revender. Meu pai entrou em contato com o rapaz, que foi ver e se interessou pelo carro, mas ofereceu apenas alguns trocados por ele, afinal, tinha muita coisa para arrumar: capô, tampa do porta-malas, pára-brisa, um para-lamas, mais funilaria e pintura. Sem saída, meu pai o vendeu, após pouco mais de 3 anos de convivência com o carrinho, sem que a viagem com ele para Parnaíba, Piauí, fosse concretizada. 

Fora diversas idas a Jundiaí ou Guarujá, a viagem mais longa que meu pai fez com ele, foi de São Paulo a Americana (260 km em ida e volta), quando precisou fazer um bate-volta nesta cidade, em uma noite, pouco antes de vendê-lo. 

Meu pai lembra que ainda o viu, depois que o novo dono o consertou, por algumas vezes, passando pela Avenida Conceição. Mas que após alguns meses, nunca mais reviu o carrinho.

Apesar da alegria inicial quando meu tio o comprou, de ter sido o primeiro carro do meu pai, o primeiro carro em que andei (meu pai foi meu buscar na Maternidade com ele), infelizmente ele não trouxe boa sorte para minha família. Não me lembro deste carro, pois eu só tinha um ano quando foi vendido. Tenho ideia dele apenas por esta fotografia. 

O próprio carro, não teve sorte: em apenas 5 de anos de uso, sofreu vários acidentes. E meu pai acredita que, possivelmente, o veículo não teve vida longa - estava cheio de problemas e o funileiro (de fundo de quintal) o arrumou "daquele jeito" apenas para revendê-lo e ganhar algum dinheiro em cima.

Após a sua venda, não havia como meu pai comprar outro automóvel e ficamos andando de ônibus/trem/metrô/táxi por 5 longos anos, até que conseguimos juntar dinheiro e comprar um novo Chevette, também 1974, mas da cor Ultra Verde. A história deste, contarei na próxima postagem. 





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