Em março de 1992, ainda morávamos em Pirassununga, mas estávamos de mudança para Bebedouro - pois meu pai tinha ido trabalhar na antiga FRUTESP (hoje, Coimbra Citrus). Com a indenização trabalhista que recebeu da Caninha 51 (atual Indústrias Müller de Bebidas), trocou o Fiat 147, 1979, Branco Alpi, que tínhamos, por um Ford Del Rey "Série Prata", 4 portas, movido à álcool, ano 1983, equipado com câmbio de 4 marchas original (o câmbio de 5 marchas era opcional em 1983), cor Prata Strato Metálico - pintura de alto padrão, na época da fabricação! O Del Rey da foto é idêntico ao que era nosso, exceto pela cor.
Na troca, o Fiat 147 entrou como 1/3 do valor do Del Rey e os outros 2/3, meu pai deu em dinheiro.
Foi o nosso primeiro carro à álcool, em uma época em que os à gasolina eram mais valorizados, mas adorava o cheirinho do álcool hidratado sendo queimado de manhãzinha.
O mais curioso é que esse carro saiu de fábrica equipado com câmbio de 4 marchas, o que era raro em Del Rey. Mas estavam lá o famoso relógio digital no teto; o toca-fitas AM/FM estéreo Philco/Ford original, com 4 alto-falantes; o interior monocromático preto, em acabamento de alto padrão; retrovisores externos em ambos os lados, com controle interno; os vidros verdes com para-brisa degradê; o vidro traseiro com desembaçador térmico; as rodas de ferro estilizadas; as 4 portas - todos equipamentos inéditos nos carros da minha família.
O nosso chegou com 133.000 km (o Del Rey já vinha com o dígito da centena de milhar no hodômetro), mas se apresentava extremamente conservado, carro de donos cuidadosos! Veio com placas amarelas de Jaboticabal/SP, mas pelo histórico da documentação, observei que o veículo havia sido tirado zero em Monte Alto/SP e nesta cidade havia sido licenciado até 1990. O Luizinho disse que o havia comprado na cidade de Ribeirão Preto/SP, de um lojista que o havia pego em uma troca. E agora ele estava em nossas mãos, em Pirassununga, e poucos meses depois, mudaria de cidade conosco, onde iria ganhar "chapas" novas, cinzas, BLZ-0228, Bebedouro/SP. Consultei a placa pelo aplicativo Sinesp Cidadão e descobri que, hoje, o Ford encontra-se registrado na cidade de Macedônia/SP. Qual será o atual estado de conservação dele?
Atualmente, o carro está registrado em Macedônia/SP |
No início de 1992, os
carros usados com até 8 ou 9 anos de uso eram bem valorizados, no interior de
SP. Afinal, carro zero quilômetro era algo para poucos: ricos ou classe média
alta (classe média mesmo, aquela que viaja todo ano, tem imóvel confortável,
estuda em boas escolas/universidades, não contrai dívidas para comprar bens não
duráveis; não essa classe média de hoje, "inventada" pelo governo, da
qual faz parte um assalariado que ganha 3 salários mínimos, com baixa
escolaridade e que paga aluguel da casa onde mora).
Mesmo o Fiat Uno
Mille era relativamente caro e, na maioria das vezes, adquirido para compor
frotas de empresas ou para servir como segundo carro de uma família mais
abastada. Alguns da Classe C conseguiam tirar um através de consórcio. Essa
situação começaria a mudar no ano seguinte, 1993, quando o então presidente,
Itamar Franco, criou um programa de carro popular, no qual os automóveis com
motor 1.0 e o Fusca e Chevette 1.6, passariam a custar cerca de 7.000 dólares.
E mudaria de vez, após julho de 1994: com o Plano Real, passou a ser possível
financiar um carro novo com parcelas fixas, dando a partir de 20% de entrada,
dividindo o restante em até 36 vezes.
Isso significa que
para a Classe C da época, ter um carro usado, com até 8 ou 9 anos de uso, era
algo relativamente comum. Poucos conseguiam adquirir um zero quilômetro através
de consórcio. Ou seja, entre as pessoas de poder aquisitivo parecido com o da minha
família, o Del Rey 1983 tinha uma certa presença, apesar de o modelo já ter
saído de linha no ano anterior (1991).
Era de cor prata
metálica, possuía um interior relativamente moderno, com relógio digital no
teto, um lindo painel e iluminação dos instrumentos azulada (um charme, na
época; todos que andavam nele de noite, elogiavam). Era silencioso, macio,
confortável, gostoso de dirigir, tinha boa visibilidade, bancos macios, ótimo
porta-malas - apesar de não ser muito espaçoso na cabine. Um carro já defasado,
mas guardava o seu charme: linhas clássicas, imponente, um belo interior....
não era tão bonito quanto o Monza, mas custava bem menos que ele.
Eu diria que, no
início de 1992, um Del Rey 1983 apresentava um bom custo-benefício: um carro
bem mais elegante do que a maioria do mesmo ano e, além disso, custava
relativamente pouco. Obviamente não era um modelo procurado por jovens que
haviam acabado de tirar a carteira de habilitação, que pelo mesmo valor
preferiam Gol refrigerado a ar, Passat 1.500 cc ou 1.600 cc, GM Opala antigo,
Monza Hatch ou Chevette 1.6.
Carros como GM Opala
Comodoro/Diplomata, GM Monza 3 volumes, VW Santana, Ford Escort ou Fiat Uno
custavam bem mais caro do que um Del Rey 83). Mas atendia bem a uma família e
era um bom carro para andar na cidade e na estrada - sem pressa, pois o motor
1.6 herdado da Renault não fazia milagres com um carro daquele peso; a despeito
disso, lembro do meu pai atingindo, nas descidas, 160 km/h indicados no
velocímetro (aferida, a velocidade deveria estar em torno de 145 km/h
reais).
E, de quebra, o nosso
possuía 4 portas, em um momento em que o motorista brasileiro passava a
preferir esse tipo de carroceria. Recebíamos muitos elogios por isso!
Claro que o Del Rey
sempre teve muitas limitações, a começar pelo projeto antigo já na época. Mas
era o primeiro carro médio da nossa família, acostumada com Chevette dos anos
70, Corcel II, Variant II e Fiat 147. É sob esse prisma que analiso a
importância que esse modelo teve para nós, no início dos anos 1990.
Se eu pudesse,
compraria um Ford Escort ou um Passat Pointer; mas o carro não era meu, mas da
minha família. E mesmo que meu pai quisesse, ele não conseguiria, naquele
momento, comprar um Ford Escort, ano 1984 - afinal custava bem mais caro. Eu
andava mais como passageiro. E mesmo quando dirigia, o fazia dentro da cidade,
bem devagar e sem pretensões de tirar um "racha". Afinal, eu tinha de
14 para 15 anos e não poderia me arriscar. Ou seja, para mim, naquela época,
tanto fazia o desempenho de um Fusca 1.200 cc ou de um Gol GTI 2.000 cc, pois
eu mal passava de 50 km/h.
Asim como outros
jovens da época, eu pegava o Ford Del Rey dos pais para passear. Dois meses
após a compra, em maio de 1992, completei 15 anos. Minha família só mudaria
para Bebedouro em 9 de julho, pois minha mãe optou por esperar o término do
semestre escolar. Ou seja, entre março e julho, meu pai passava a semana toda
fora (ia para Bebedouro segunda-feira de manhã e só voltava sexta-feira de
noite, de carona em um Passat LS 1.6, 1983, Verde Álamo, com um colega que
tinha ido trabalhar com ele na mesma empresa. Então, eu aproveitava para andar
bastante no Del Rey pela cidade toda, juntamente com meu irmão
Wallistein.
Eu era alto, não
aparentava ter 15 anos e passava despercebido pela polícia - outros tempos,
hoje seria muito difícil fazer isso. Lembro de uma vez em que fui com meu irmão
no centro da cidade, buscar um aparelho de som 4x1 da Gradiente, que meu pai
havia comprado no sábado, mas que na segunda-feira mesmo fomos na loja buscá-lo
- pois não tivemos a paciência para esperar a entrega.
Que tempo bom, viu?!
Cursava Ensino Médio, flertava com as gatinhas, meu irmão morava conosco,
assistíamos inúmeros filmes (principalmente nacionais), acompanhávamos o
Campeonato Brasileiro (no qual, o Flamengo consagrou-se campeão naquele ano,
para minha decepção - afinal sou santista), víamos as meninas passarem em
frente de casa (pois morávamos ao lado de uma escola (Júlia Colombo de
Almeida).
Havia uma menina de
14 anos, que estudava nesta escola e morava ali nas redondezas. Nos finais de
tarde, depois que ela saía da aula, ia até sua casa, pegava uma motocicleta
Honda CB 400 cc, e passava várias vezes em frente à nossa casa, trocando as
marchas descalça, acelerando ao passar pela lombada que havia quase em frente.
Era a nossa musa! kkkkkkkkkkk
A minha tão desejada
Caloi Mobylette 1987 ficou encostada, eu não queria mais saber dela. Passei a
insistir para meu pai trocá-la por uma moto usada. Vi várias Honda CG 125
"tanque redondo", Agrale Elefant, Yamaha DT 180 e até uma Yamaha RD
350 que estava "encostada" em uma oficina. O dono da RD pegava
minha Mobylette como parte do pagamento, mas meu pai ficou com medo de comprar
para mim uma moto tão potente.
Na semana do meu
aniversário (início de maio), encontrei uma loja de motos em Leme (cidade a 21
km de Pirassununga) que tinha uma Honda CG 125 "tanque redondo",
1978, azul e pegava minha Mobylette como parte do pagamento. Só que eu teria
que levá-la até lá! Meu pai concordou com o negócio, então, ingenuamente,
peguei a Rodovia Anhanguera, pelo acostamento, rumo a Leme. Não rodei muito e
fui parado por um Gol refrigerado a ar da Polícia Rodoviária. O policial disse
que recolheria o ciclomotor para o pátio do posto de Polícia, então meu irmão
Wallistein assumiu a direção da Mobylette, para evitar o pagamento do guincho -
afinal ele era maior de idade (apesar de não ter, naquela época, carteira de
habilitação).
Felizmente aquela
Caloi estava emplacada e com a documentação em dia, então sábado meu pai foi
até o posto de Polícia e com a CNH, retirou o ciclomotor. Na semana seguinte o
vendeu para o dono de um sítio em Porto Ferreira. O novo proprietário não se
importou com as multas, pois só iria utilizá-lo em estradas rurais (de terra).
Após 5 meses e 1.200 km rodados na minha mão, a Caloi Mobylette mudava de dono,
exibindo 3.900 km no hodômetro. Desistimos de comprar uma moto.
Como meu pai tinha um
dinheiro guardado e a inflação corroía o dinheiro, mesmo na poupança, resolveu
comprar um segundo carro. Então, vimos alguns, como:
- Corcel
II "standart" (o mais básico), 1979, Amarelo Igaratá - de um
policial civil que morava em frente de casa;
- Passat
TS, 1978, Verde Mantiqueira Metálico - que estava sendo reparado em uma
oficina do bairro;
- Belina
II L, 1979, Branco Nevasca - de um sargento do 2º RCC do Exército;
- e
Passat LS, 3 portas, 1977, Bege Saara - que estava em uma loja de carros
usados, localizada na Avenida Newton Prado (Avenida Veículos).
O meu preferido foi o
Passat TS, claro! Esportivo, motor 1.600 cc, 4 faróis redondos na frente! Babei
no carro, principalmente na cor, um verde metálico lindo, ornamentado com as
faixas pretas da versão! Mas meu mecânico me desanimou, disse que aquele
carburador duplo era alemão e que não existiam mais peças para ele. Que se
desse problema, eu teria que "jogá-lo no meio do mato" e comprar
outro.
Resumindo, dia
10/05/1992, pela primeira vez, passamos a ter um 2° carro: compramos o Passat
LS, 3 portas, 1977, motor 1.500 cc, cor Bege Saara, mas contarei a história
deste na próxima postagem, pois ainda ficaríamos quase 1 ano com o Del Rey, e
tenho muita história para contar sobre ele.
O nosso era idêntico, inclusive bancos de encosto alto; porém, o interior era preto |
Passat e Del Rey tinham dirigibilidade, comportamento
e características muito distintas; o primeiro exibia linhas externas simples,
sem frisos ou cromados, interior e painel bem "pobres", acabamento
frágil e barulhento (painel trincava, o estofamento e as laterais de porta se
desfaziam), mas era bem justinho, possuía direção direta - muito leve -
câmbio curto e preciso, bom de arrancada - apesar do motor 1500 cc e uma
estabilidade exemplar; o segundo era mais pesado, arrancava mais devagar, porém
era bem mais macio, silencioso, luxuoso, equipado, confortável e bonito. Então
eu escolhia o carro em que eu ia sair, de acordo com a proposta do passeio,
hehehe.
Até julho, dirigi muito esses dois carros por Pirassununga.
No dia 06/07, meu irmão Wallistein voltou para Campinas. Em seguida, ele se
mudou para a Bahia, onde hoje é policial.
Dia 09/07 mudamos para Bebedouro/SP.
Os móveis foram de caminhão. Fui no Del Rey com meu pai; no
Passat foram minha mãe e minhas irmãs. Chegamos em Bebedouro no final da tarde
e pudemos conhecer nossa nova casa, situada na rua Augusto de Carvalho, no
Jardim Alvorada. Era um imóvel de tijolinho à vista na fachada (na época, ainda
estava na moda) e possuía uma linda varanda coberta de telhas na frente. Uma
bonita residência, apesar de ser localizada em um bairro distante do centro da
cidade. Mas foi a única que meu pai encontrou para alugar.
Em Bebedouro, passei a dirigir menos os carros, pois a cidade era bem mais policiada, sempre havia blitz nas avenidas. Portanto meus rolês se restringiam ao bairro - e à algumas escapadas de noite, hahahahaha.
Com esse Del Rey, fizemos algumas viagens: de Bebedouro, fomos algumas vezes a Pirassununga, viajamos a Americana, também para São Paulo e íamos toda semana a Ribeirão Preto, levar minha mãe ao médico (ela tinha passado por uma cirurgia). O carro não dava oficina, era só abastecer, trocar o óleo de 5 em 5.000 km e rodar. Robusto, econômico, durável e confiável. Seu motor à álcool foi o melhor que já dirigi entre carros fabricados nos anos 80: era virar a chave de manhã, mesmo no frio, e sair com ele, sem engasgos, falhas ou afogamentos. Esquentava rápido e era só alegria! Ainda lembro do quão gostoso era viajar com ele, quanta maciez! Hoje prefiro carros mais esportivos, mas o Del Rey marcou minha adolescência em família.
Em fevereiro de 1993, meu pai o vendeu para o dono do posto de gasolina do Jardim Cláudia. Este estava vendendo o posto e iria se mudar para Ribeirão Preto semanas depois. De fato, em seguida o posto mudou de dono. E nunca mais vi o Del Rey, que foi embora após 11 meses, marcando 157.000 km no hodômetro, sendo 24.000 km rodados nas nossas mãos. Hoje esse veículo encontra-se registrado em Macedônia/SP - só não sei qual o estado de conservação atual dele. Acredito que esteja firme e forte, pois era um carro "filé", bem cuidado e conservado.
Só nos desfizemos dele, porque encontramos um outro Del Rey à venda: um "Série Ouro", 2 portas, ano 1982, à gasolina, cor Azul Clássico Metálico, com interior monocromático marrom, travas das portas e vidros elétricos, ar condicionado, painel completo (com conta-giros, entre 6 instrumentos) e rodas de liga leve. Vendemos o Prata em um dia e compramos o Azul no outro.
Mas a história deste, contarei posteriormente, pois antes tenho duas para narrar: a do Passat 77 supracitado; e a de um VW Fusca 1300, ano 1970, Bege Claro, que conviveu com os 2 Del Rey. Na postagem do Fusca, de quebra, contarei sobre uma Monark Monareta, 1985, vermelha. Altas emoções pela frente! Kkkkkkk
Próxima postagem: VW Passat LS, 3 portas, motor 1.500 cc, ano 1977, Bege Saara.
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